É muito difícil avaliar o mal que a sociologia fez à história. Um ensaio sobre o contemporâneo, como o nosso “A Reforma Agrária em S. Manços”, será sempre criticável sob a perspetiva dum social quase totalitário, das condições de vida, às situações de fome, das “formas de luta” (jargão esquerdista de extrema infelicidade) à repressão policial e política, como também o será no que se refere à produção agrícola (cujos dados foram deliberadamente omitidos do nosso ensaio para que não caísse num estatismo redutor, pois é o Estado que produz incansável e erraticamente tais fontes), e à relação capitalista do lucro com o trabalho. Um estudo sociológico coevo é mais inútil à história do que o jornal de ontem e, no entanto, parece aos presentes tão prenhe de relevância quanto se deixa embeber pelo discurso da época.
Perdoem-me pois os sociólogos da história, quanto não lhes perdoo a crítica das omissões e das incompletudes. Na verdade, não interessa uma sociologia da fome, tanto mais que, pelo menos aquela, já passou. Por outro lado, não houve, nunca, resistência significativa ao processo de proletarização. Não faz sentido apurar agora porque falhou a luta de alguns. Na pequena história das relações familiares e de entreajuda, apuram-se milhões de resistências e de humilhações, de amarfamentos e privações de liberdade. A luta, e sobretudo a derrota, foi muito mais global.
O Alentejo não foi o lugar da fome, do trabalho sobre-humano, do sacrifício, da exploração crua do próximo (aí a Beira ou a serra algarvia ganham-lhe aos palmos). Foi sim um território de proletarização organizada, adestrada e vigiada. Por isso, tem merecido tanta atenção, enquanto lugar de biopolítica.
O tema do nosso ensaio não interessa aos sociólogos, nem aos políticos. Quem vive próximo, contra ou a favor, do poder, nunca o põe verdadeiramente em causa. Ora, não é possível defender a agricultura sem combater, em simultâneo, o trabalho sazonal. Hoje, algumas almas penadas importam por alguns meses trabalhadores vietnamitas. El Ejido está em decadência. E ainda assim, da esquerda à direita, do proprietário avondo ao amanuense aposentado, um coro de boas intenções propugna a sazonalidade, à pala de um El Dorado de pepinos transgénicos.
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