Excerto do livro "A Reforma Agrária em S. Manços", sobre Eça de Queiroz em Évora, ao serviço das manobras políticas de Eugénio de Almeida e do Conde Peniche:
"[José Maria Eugénio de Almeida] Foi um dos homens mais influentes do seu tempo. Em parceria com o Marquês de Ficalho, em 1854, contrata com o Governo a construção da linha de caminho-de-ferro de Montijo a Vendas Novas, depois desviada para o Barreiro, não sem que lhe tenham sido dirigidas críticas de ter escolhido o traçado, concluído em 1864, para beneficiar de uma ligação direta às suas propriedades de Évora (Alegria, 260-261). Também contratará a ligação a Setúbal. O poder económico permitia-lhe fazer empréstimos a políticos como o Duque de Loulé (que chegou a dever-lhe 9 contos) e o Duque de Saldanha, entre outros (Sardica, 181,230), manobrar eleições e patrocinar campanhas políticas (Ramos, 537).
"[José Maria Eugénio de Almeida] Foi um dos homens mais influentes do seu tempo. Em parceria com o Marquês de Ficalho, em 1854, contrata com o Governo a construção da linha de caminho-de-ferro de Montijo a Vendas Novas, depois desviada para o Barreiro, não sem que lhe tenham sido dirigidas críticas de ter escolhido o traçado, concluído em 1864, para beneficiar de uma ligação direta às suas propriedades de Évora (Alegria, 260-261). Também contratará a ligação a Setúbal. O poder económico permitia-lhe fazer empréstimos a políticos como o Duque de Loulé (que chegou a dever-lhe 9 contos) e o Duque de Saldanha, entre outros (Sardica, 181,230), manobrar eleições e patrocinar campanhas políticas (Ramos, 537).
Em Évora, em 1866, arregimentou lavradores, proprietários e caciques locais contra o Governo de Fusão, formado pelos regeneradores de Fontes Pereira de Melo e pelos históricos do Duque de Loulé. Pretende em primeira linha impedir a aprovação do novo imposto sobre o consumo que o Governo apresentara ao parlamento, bem como tenta a redução da contribuição predial que atingia os seus numerosos prédios. Em segunda linha, pretende levar ao Governo o seu amigo Lobo d’Ávila, para o que conta com a organização do Conde de Peniche, mação riquíssimo, que instigava o povo a nível nacional. Eugénio de Almeida participa na oposição, financiando aqueles grupos e fundando o periódico Distrito de Évora, segredo que foi finalmente revelado por José Sardica. Entrega a direção do jornal ao jovem Eça de Queiroz, filho de um amigo dos tempos da universidade (Sardica, 149), que também integra a oposição. Eça, recém-licenciado em direito, publicando alguns textos na Gazeta de Portugal, ainda longe do grande sucesso que granjeará como escritor, instala-se em Évora de Janeiro a Julho de 1866, com a elevada remuneração mensal de 100$000, assumindo a responsabilidade de produzir e editar o jornal praticamente sozinho (Rodrigues, 9). Outros escritores célebres como Antero de Quental e Oliveira Martins colaboram também com a organização do Conde de Peniche, escrevendo no jornal República Federal, e o primeiro chegou a passar por chefe de uma associação de trabalhadores radicais no bairro popular de Alcântara (Ramos (2), 503). A aventura de Eça defronta-se com a bem organizada Folha do Sul, jornal eborense que lhe faz marcação cerrada e que o apanha em falso mais do que uma vez. O Distrito de Évora tenta justificar, contra a evidência, a representatividade de um abaixo-assinado contra as medidas do Governo que Eugénio de Almeida pusera a correr em Évora. A Folha do Sul descobre que parte das 650 assinaturas são repetidas, de gente de fora ou de menores e, para mais, apanha Eça em erro de cálculo sobre as estimativas da população da cidade (o nosso excelentíssimo colega demorou-se pouco tempo na escola primária, porque os espíritos superiores não cuidam de bagatelas) e, depois, apanha-o a parafrasear Victor Hugo, nos Miseráveis (sabemos distinguir as estrelas que as patas dos marrecos fazem na lama, das constelações divinas e esplêndidas que habitam no infinito). Eugénio de Almeida vê-se acusado no parlamento de falta de legitimidade na representação dos abaixo-assinados colhidos nas principais cidades. Eça exagera na caracterização de Évora: uma terra em que tudo é livre, e com abundância, a cacetada, a pedrada, a punhalada, a prostituição, a obscenidade, onde há menos segurança do que na última aldeia da Turquia. Será forçado a mudar de opinião: o povo de Évora é sossegado. Mas a Folha do Sul acusa-o de vomitar injúrias. Eça abandona o Distrito de Évora, projecto que lamentará ter abraçado, e a Folha do Sul remoca: não é tão pequeno jornal que não lhe tenha cabido nas suas humildes colunas milhares de demonstrações de inépcia e da infelicidade dialéctica do conterrâneo (Queiroz; Folha do Sul de 30/03, 13/04, 24/04, 1/05, 8/05, 11/05 e 29/06/1867). As manobras dos penicheiros, em que se enquadra, entre outras manifestações populares induzidas, como o lock-out dos merceeiros do Porto, conseguem derrubar o Governo em 1868, com a intervenção do Rei D. Luís. O imposto sobre o consumo é suspenso e a reforma administrativa é revogada (concelhos como Viana do Alentejo estiveram extintos durante um mês (J. Sousa, 47). Lobo d’Ávila forma um novo Governo, que três meses depois, sem dinheiro, era atacado por toda a gente, dos penicheiros aos fusionistas (Ramos, (2) 495). Eugénio de Almeida conseguiu o seu desiderato."
Por João de Sousa, permitida a reprodução desde que cite a fonte e o autor do texto.
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